Registro de Imóveis – Escritura de Divisão Amigável de Imóvel – Exigência de comprovação do reconhecimento administrativo pela Secretaria da Fazenda Municipal da não incidência de ITBI, mediante apresentação de certidão expedida pelo Sistema de Gestão de Benefícios Fiscais – GBF do Município de São Paulo – Divisão igualitária – Não configuração de transmissão de imóvel por ato oneroso – Quinhões das partes respeitados, sem nenhum acréscimo patrimonial – Inexistência de fato gerador do ITBI – Óbice ao registro que merece ser afastado – Dá-se provimento ao recurso.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1039805-36.2020.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante JOSÉ MODESTI SANCHEZ, é apelado 9° OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, v.u”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 25 de março de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1039805-36.2020.8.26.0100

Apelante: José Modesti Sanchez

Apelado: 9° Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO Nº 31.478

Registro de Imóveis – Escritura de Divisão Amigável de Imóvel – Exigência de comprovação do reconhecimento administrativo pela Secretaria da Fazenda Municipal da não incidência de ITBI, mediante apresentação de certidão expedida pelo Sistema de Gestão de Benefícios Fiscais – GBF do Município de São Paulo – Divisão igualitária – Não configuração de transmissão de imóvel por ato oneroso – Quinhões das partes respeitados, sem nenhum acréscimo patrimonial – Inexistência de fato gerador do ITBI – Óbice ao registro que merece ser afastado – Dá-se provimento ao recurso.

1. Trata-se de apelação interposta por José Modesti Sanches contra a sentença que julgou procedente a dúvida suscitada pelo 9º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, confirmando a negativa de registro de Escritura de Divisão Amigável tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 17.833 junto àquela serventia imobiliária, em virtude do não preenchimento de formulário eletrônico no Sistema de Gestão de Benefícios Fiscais GBF da Prefeitura de São Paulo (fl. 40/43).

Sustenta o apelante, em síntese, a inexigibilidade da declaração do órgão municipal de não incidência de imposto no negócio jurídico, eis que havida divisão igualitária do imóvel, sem transferência de patrimônio. Assim, entende ser desnecessária a comprovação do preenchimento de formulário para não incidência de tributo, como exigido pelo registrador (fl. 48/52).

A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fl. 71/73).

É o relatório.

2. A dúvida foi suscitada pelo 9º Oficial do Registro de Imóveis da Capital em virtude de recusa do registro de Escritura de Divisão Amigável, lavrada em 01 de abril de 2020 perante o 2º Tabelião de Notas da Capital, por meio da qual houve a divisão do imóvel matriculado sob nº 17.833 junto àquela serventia imobiliária, com a consequente extinção do condomínio até então existente, sendo atribuído a José Modesti Sanchez, casado com Eliane Madeira Sanchez, o prédio nº 603-B da Rua Marechal Renato Paquet e respectivo terreno (Lote “B” do Projeto de Desdobro), e a Lídia Richeter, viúva, Marcello Richter, casado com Magali Fonseca Richter, Cristhiane Richter Natoli, casada com Eduardo Natoli, e Renato Richter, casado com Angélica Cristina Jeronymo Richter, o prédio nº 603-A da Rua Marechal Renato Paquet e respectivo terreno (Lote “A” do Projeto de Desdobro).

Na nota devolutiva expedida, o registrador consignou que, a despeito de ter constado da escritura que não há incidência do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis ITBI, referente à divisão do imóvel da matrícula nº 17.833, faltou a “comunicação feita à Prefeitura do Município de São Paulo pelo referido ato (divisão), juntando, para tanto, a certidão de Gestão de Benefícios Fiscais (GBF)” (fl. 10).

É dever do Oficial de Registro de Imóveis a fiscalização do pagamento dos impostos devidos em razão dos títulos apresentados para registro em sentido amplo, pena de responsabilidade solidária. Nesse sentido, dispõem o art. 289 da Lei de Registros Públicos e art. 134, inciso VI, do Código Tributário Nacional:

“LRP – Art. 289 – No exercício de suas funções, cumpre aos oficiais de registro fazer rigorosa fiscalização do pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício.”

“CTN – Art. 134 – Nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente com este nos atos em que intervierem ou pelas omissões de que forem responsáveis:

(…) VI os tabeliães, escrivães e demais serventuários de ofício, pelos tributos devidos sobre os atos praticados por eles, ou perante eles, em razão do seu ofício;”
Contudo, no caso concreto, em que pese o zelo e cautela do registrador na fiscalização em relação ao recolhimento dos impostos, tem-se que o óbice apresentado merece ser afastado.

Assim se afirma, pois o art. 35 do Código Tributário Nacional c.c. o art. 156, inciso II, da Constituição Federal estabelecem que o fato gerador do imposto de transmissão de bem imóvel ITBI é a transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição, competindo aos Municípios legislar a respeito de sua instituição.

Ocorre que, segundo se depreende da matrícula nº 17.833 do 9º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, o apelante José Modesti Sanchez, casado com Eliane Madeira Sanchez, é proprietário de 50% do imóvel, enquanto Lídia Richeter, viúva, Marcello Richter, casado com Magali Fonseca Richter, Cristhiane Richter Natoli, casada com Eduardo Natoli, e Renato Richter, casado com Angélica Cristina Jeronymo Richter, são proprietários dos outros 50% do imóvel, na proporção de 37,5% para a primeira e 4,166% para cada um de seus filhos (fl. 21/25). Por outro lado, na escritura pública de divisão de imóvel consta que os coproprietários resolveram extinguir o condomínio até então existente, passando a pertencer, exclusivamente, ao apelante o imóvel assim descrito: “UMA CASA com 105,00m² (cento e cinco metros quadrados) de área construída, situada à Rua Marechal Renato Paquet, nº 603 (que apenas para efeito de localização é identificada pelo número 603-B), E SEU RESPECTIVO TERRENO, constituído de parte do lote 27, designado no projeto de desdobro como PARTE ‘B’ DO LOTE 27 (…), encerrando um área de 175,00m² (…), com valor venal de referência proporcional de R$ 270.858,00” e aos demais, “UMA CASA com 105,00m² (cento e cinco metros quadrados) de área construída, situada à Rua Marechal Renato Paquet, nº 603 (que apenas para efeito de localização é identificada pelo número 603- A), E SEU RESPECTIVO TERRENO, constituído de parte do lote 27, designado no projeto de desdobro como PARTE ‘A’ DO LOTE 27 (…), encerrando um área de 175,00m² (…), com valor venal de referência proporcional de R$ 270.858,00”. Constou, ainda, que a “divisão é feita sem torna ou reposição em dinheiro por qualquer das partes, que se dão plena, mútua e recíproca quitação” (fl. 05/08).
Como se vê, no título apresentado a registro a divisão foi igualitária, resultando em dois imóveis com a mesma área de 175m² e o mesmo valor de R$ 270.858,00 para cada um dos imóveis desdobrados. Ademais, ficou expressamente consignado que não haveria torna ou reposição em dinheiro por qualquer das partes, o que confirma que não houve transmissão de imóvel por ato oneroso, sendo respeitados os quinhões das partes, sem nenhum acréscimo patrimonial.

Em suma, inexistindo fato gerador do imposto em debate, a exigência formulada pelo registrador não se sustenta e, por conseguinte, o óbice ao registro merece ser afastado.

3. À vista do exposto, pelo meu voto, dou provimento ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

(DJe de 09.06.2021 – SP)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *